O que é a COP-26 e qual a sua importância para conter, enquanto é tempo, as mudanças climáticas, o aquecimento global e a emergência climática de que milhares de cientistas tem alertado
“O mundo existe para todos, porque todos nós, seres humanos, nascemos nesta terra com a mesma dignidade. Como comunidade, temos o dever de garantir que cada pessoa viva com dignidade e disponha de adequadas oportunidades para o seu desenvolvimento Integral. Deus deu a terra a todo gênero humano, para que ela sustente todos os seus membros, sem excluir nem privilegiar ninguém” (Papa Francisco, Fratelli Tutti, 218 e 219)
“Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social, mas uma única e complexa crise socioambiental. As diretrizes para a solução requerem uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza” (Papa Francisco, Laudato Si, 139)
Estamos `as vésperas da COP 26 – mais uma Conferência do Clima, que reunirá em torno de 200 Autoridades, a grande maioria ou quase a totalidade, com poucas ausências, de Chefes de Estado, Chefes de Governos, e milhares de outros participantes. líderes empresariais, religiosos, militantes de ONGs (Organizações não Governamentais), movimentos sociais, em Glasgow, na Escócia, Reino Unido, de 31 deste mês de Outubro até 12 de novembro próximo (2021).
O grande objetivo ou o que os estudiosos têm denominado de objetivo estratégico é analisar o que os países, principalmente os maiores poluidores do planeta tem feito para cumprirem as metas que firmaram no Acordo de Pais em 2015, para que o aquecimento global/temperatura média da terra, não ultrapasse 1,5 graus, em relação ao que existia no início do período de industrialização, há 170 anos.
O que se busca é que seja realizado um debate franco, honesto, sem mentiras e fake news, sobre o que cada país, realmente, está realizando para enfrentar o aquecimento global e a EMERGÊNCIA CLIMÁTICA, antes que o “ponto do não retorno”, ou seja, o nível de degradação dos ecossistemas, da destruição da biodiversidade e o aquecimento global atinjam níveis intoleráveis, tornando praticamente impossível todos os tipos de vida, inclusive a vida humana, no Planeta Terra, denominado de “Nossa Casa comum”, pelo Papa Francisco.
O que é a COP-26 e qual a sua importância para conter, enquanto é tempo, as mudanças climáticas, o aquecimento global e a emergência climática de que milhares de cientistas tem alertado os governantes, os empresários, a população e, enfim, o mundo?
A COP-26 é mais uma reunião, como suas congêneres anteriores há mais de duas décadas, sob os auspícios e coordenação da ONU, entre representantes das partes, ou seja, dos países que há décadas vem se comprometendo e não cumprindo integralmente com metas que evitem uma catástrofe anunciada em relação `as condições de vida no planeta.
Desde 2015, quando quase duas centenas de países firmaram o ACORDO DE PARIS, que todos os anos os representantes de governos, de todos os matizes políticos e ideológicos, sistemas econômicos, políticos e sociais, além de representantes de movimentos sociais, ONGs, mundo empresarial, líderes religiosos, cientistas, pesquisadores se reúnem para avaliarem as ações e omissões que os países têm realizado ou deixaram de realizar quanto `as metas acordadas.
Mesmo que o Papa Francisco, líder espiritual e pastor de mais de 1,34 bilhão de fiéis, onde estão incluídas pessoas comuns e também governantes, empresários, espalhados por todos os continentes e países, não possa comparecer, a Delegação que representará o Vaticano e a Igreja Católica, estará presente e participará das discussões da COP-26.
Outro líder mundial que deverá comparecer é o atual Presidente dos EUA, Joe Biden que, diferentemente de seu antecessor Donald Trump que chegou a retirar o segundo país que mais polui do Acordo de Paris, o atual presidente decidiu recolocar o seu país novamente nos trilhos das discussões climáticas, além de ter e dar certa ênfase em transformar a economia americana em uma economia verde.
Diversos outros países continuam com suas economias baseadas em matrizes energéticas que utilizam combustíveis fósseis, principalmente a China e índia ou na destruição e queimadas de suas florestas, como o Brasil e a Indonésia, terão muitas dificuldades para convencerem os demais participantes de que estejam, realmente, cumprindo as cláusulas e metas do Acordo de Paris.
Talvez seja por isso, que o Presidente Bolsonaro não chefiará a delegação brasileira, que deverá comparecer `a COP-26, praticamente de mãos vazias, pois em vez de o Brasil realizar as ações e metas com as quais o país se comprometeu em 2015, no Acordo de Paris, a preocupação do atual governo foi “flexibilizar” os sistemas de controle e fiscalização, sucatear os organismos responsáveis pela área ambiental, enquanto deixava e continua deixando “a boiada passar”.
Sabemos e esta realidade, do aquecimento global, das mudanças climáticas, da destruição da biodiversidade, do aumento das catástrofes naturais que tem origem na ação humana, já tem sido constatada por inúmeros estudos e em alertas constantes por milhares de cientistas, de que os modelos econômicos, sociais, políticos e culturais baseados no uso intensivo de combustíveis fósseis (Petróleo, Carvão e Gás Natural), ao lado do desmatamento/destruição de todas as florestas, não apenas as tropicais que ainda restam, em todos os países e biomas; do uso de um sistema de transporte , também baseado em fontes sujas de energia, altamente poluidora; do consumismo, desperdício e descarte que aumentam assustadoramente, em ritmo muito maior do que o crescimento populacional e das taxas de urbanização, gerando mais lixo, resíduos sólidos, tornando os cursos d’água, córregos, rios, baias e os oceanos na maior lixeira do planeta, tem acarretado níveis alarmantes de poluição do ar, das águas e do solo e, como consequência, a emissão em níveis intoleráveis de gases de efeito estufa e todas as demais formas de poluição.
Quando se trata da destruição do planeta, em relação `a geração e emissão de gases poluentes, os chamados gases de efeito estufa, responsáveis diretos pelo aquecimento do planeta, pelas mudanças climáticas, pela elevação da temperatura dos oceanos, pela perda e destruição da biodiversidade, ou seja, a vida no planeta e a degradação generalizada que estamos assistindo em todo o mundo, nem todos os países são igualmente responsáveis por este processo catastrófico.
O aquecimento global pode ser observado ou analisado de duas perspectivas, a primeira é a quantidade ou volume de gases de efeito estufa que estão concentrados na atmosfera e que foram produzidos ao longo do processo de industrialização, em quase dois séculos e a segunda, é o volume anual de gases poluentes que os países continuam produzindo a cada ano.
O volume desses gases poluentes atualmente “estocado” na atmosfera é de 412,5 partes por milhão de dióxido de carbono em 2020, conforme dados coletados por cientistas do Observatório Oceanográfico e atmosférico dos EUA.
Os países que lideram o ranking histórico dessas emissões são os EUA (20,3%); China (11,4%), Europa (10,5%); Rússia (6,9%), Brasil (4,5%). Neste contexto o nosso país é o sexto país que mais contribuiu para este acúmulo de gases de efeito estufa. Enquanto os países Europeus, Asiáticos (China, Japão, Coreia do Norte e Índia), EUA e Canadá emitiram esses gases oriundos do uso de combustíveis fósseis, o Brasil e a Indonésia, por exemplo, produziram mais de 80% das emissões de gases poluentes na atmosfera, oriundos do desmatamento, queimadas e uso da terra para atividades agropecuárias ,extração de madeiras ou grandes represas hidrelétricas e, em menor nível que a poluição urbana e industrial.
Entre 1850 e 1920 houve um aumento de 85% de acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera, sendo que parte deste volume, são absorvidos, sequestrados pelos oceanos e pelas florestas. Assim, `a medida que o desmatamento e queimadas se intensificam e a poluição e destruição da biodiversidade, inclusive marinha e lacustre aumentam, este mecanismo de sequestro perde sua eficácia e os gases sequestrados da atmosfera e que estavam “estocados no solo ou nos oceanos, acabam novamente retornando para a atmosfera, jantando-se a outros bilhões de toneladas de gases de efeito estuda que continuam sendo produzidos por todos os países, principalmente, pelos 15 ou 20 países que mais continuam poluindo o planeta.
Entre 1850 e 2020, fruto do processo de crescimento econômico, principalmente da industrialização e atividades conexas, ao todo foram produzidos cerca de 2,5 bilhões de toneladas de CO2 (GtCO2). Com isso, restam apenas 500 GtCO2 do “orçamento de carbono”, o limite máximo para que as médias de temperaturas do planeta possam ficar abaixo dos 1,5ºC de aquecimento, como previsto pelo Acordo de Paris.
Durante o período da pandemia do coronavírus, com uma queda significativa das atividades econômicas na maioria dos países, houve uma certa “trégua” em relação `a emissão de gases poluentes na atmosfera. Todavia, com a retomada das atividades econômicas de forma mais acelerada no pós pandemia e tendo em vista que pouca coisa mudou em relação `as práticas econômicas e sociais, com certeza o ritmo de poluição do planeta vai continuar e Talvez aumentar, com maior intensidade do que em anos recentes, frustrando as expectativas quanto ao alcance do Acordo de Paris e da COP-26.
Todavia, apesar dos vários acordos climáticos e diversas conferências mundiais sobre desenvolvimento e meio ambiente, sobre sustentabilidade e outras preocupações afins, firmados por praticamente todos os países, inclusive pelos que mais continuam poluindo o planeta, praticamente a grande maioria das metas acordadas tem ficado apenas no papel e o mundo, principalmente as lideranças politicas e empresariais da maioria dos países, continuam fingindo que estão agindo para melhor cuidar do planeta (a nossa casa comum).
As emissões de gases de efeito estufa, ligadas ao uso de combustíveis fósseis e o uso da terra, praticamente quadruplicaram nos últimos 60 anos e aumentaram quase 12 vezes no século passado. “O 0,2 GtCO2 liberado em 1850 equivale a apenas 0,5% dos cerca de 37 GtCO2 que provavelmente serão emitidos em 2021”, revelam os dados dos relatórios mais recentes sobre o clima Isto demonstra que tem havido muito blá, blá, blá nesses encontros e nos acordos firmados entre os países, pouca coisa de concreto tem sido feita que promovam mudanças significativas nesta caminhada rumo `a destruição do planeta e todas as formas de vida.
Dados do Atlas de Carbono, de 2017, indicam que A china é o país que, atualmente, mais polui o planeta com 28% da emissão do total de gases de efeito estufa lançados na atmosfera; seguindo-se EUA 14%; Índia 7%; Rússia 5%; Japão 3%; Alemanha 2,8%; Coreia do Sul e Irã (2% cada), e outros 7 países, incluindo Brasil que ocupava a 13a. posição, com volumes que variam entre 1,0% e 1,5%.
Esses quinze maiores poluidores do planeta são responsáveis por 83% do volume desses gases tóxicos que estão destruindo a camada de ozônio, produzindo o aquecimento global do planeta e gerando a emergência climática que está batendo `as nossas portas, gerando todas as crises socioambientais, tornando a vida em geral e a vida humana em particular, praticamente impossível, enquanto as discussões sobre o clima se arrastam e diversos países teimam em continuar imaginando que o crescimento econômico baseado em combustíveis fósseis e na degradação dos ecossistemas e biomas não tem consequências universais ou que cada país pode, soberanamente, continuar destruindo o planeta.
Coerente com o que vem falando e insistindo em relação `a ecologia integral e a necessidade de um melhor cuidado com a criação, com o bem comum, com as futuras gerações, com a vida no planeta foi que, para preparar a contribuição do Vaticano a ser apresentada na COP-26, o Papa Francisco reuniu-se recentemente com diversos outros líderes religiosos e cientistas em Roma.
Cuidar do planeta e combater a crise socioambiental que se abate sobre todos os países não é uma questão meramente tecnológica, econômica e financeira, mas, fundamentalmente, uma questão ética, moral, cultural e humana, por isso todas as pessoas são chamadas a participar dessas discussões e das ações que possam transformar os modos de produção, as relações de trabalho, as politicas públicas, as atitudes e comportamentos que levam `a destruição do planeta.
A ênfase do documento do Vaticano e de outros países participantes da COP-26, é no sentido de que os países ricos ou de renda média, como o Brasil e outros mais, ou seja , os 15 países ou o G-20 que mais poluem o planeta devem promover mudanças profundas e radicais em seus modelos econômicos, de trabalho, de uso dos recursos naturais e respeitarem mais os limites do planeta.
Outro aspecto é quanto `a necessidade desses países que mais tem poluído o planeta e que continuam poluindo, prejudicando os demais países têm a obrigação moral, além de realizarem mudanças internas que alterem os rumos do próprio crescimento/desenvolvimento econômico, para repararem os danos causados e os danos atuais que continuam causando, precisam compensar, ou seja, proverem recursos tecnológicos e financeiros para que os países subdesenvolvidos, pobres e de baixa renda possam também promoverem mudanças, principalmente o uso de fontes renováveis de energia e de uso da terra e das águas, para que os impactos das atividades econômicas desses países não venham contribuir para o aumento da poluição do planeta e do aquecimento global.
No caso dos países que ainda possuem florestas os mesmos deveriam ser beneficiados/remunerados por esses “serviços ambientais”, que as florestas prestam para a manutenção do clima em níveis que atendam os parâmetros estabelecidos no Acordo de Paris. Afinal, Floresta preservada vale mais do que área degradada, como acontece em inúmeros países, inclusive no Brasil.
De forma semelhante, para que tais parâmetros sejam atingidos, é fundamental tanto a despoluição dos oceanos, que já se transformaram em uma imensa lixeira planetária, quanto medidas para que todos os países parem de poluir os diversos cursos d’água que acabam desembocando nos oceanos e também mecanismos para sequestrarem os gases poluentes que estão “estocados” na atmosfera.
O custo dessas medidas devem ser de responsabilidade proporcional de quem tem poluído e de quem continua poluindo, ou seja, todos precisam “fazer o dever de casa”, mas os países que são considerados os grandes/maiores poluidores do planeta devem pagar um quinhão maior desta fatura.
Enfim, vamos aguardar como deverá ocorrer a COP-26 e quais os compromissos que serão reafirmados ou firmados, com vistas a momentos específicos como os anos de 2030; 2040 e 2050.
Se a humanidade não acordar, com certeza as futuras gerações pagarão um preço incalculável em termos de danos socioambientais, causados pela falta de visão de futuro das gerações que nos antecederam e das atuais gerações, principalmente as autoridades públicas/políticos e líderes empresariais, as primeiras que só pensam nas próximas eleições e as segundas, que continuam só pensando em seus lucros imediatos e a qualquer preço, inclusive inviabilizando a vida neste planeta terra.
Será que esses imaginam que ficarão a salvo desta destruição socioambiental e suas consequências?
JUACY DA SILVA, professor-fundador, titular e aposentado, UFMT. Sociólogo, mestre em sociologia, articulador da Pastoral da Ecologia Integral no Centro-Oeste Email profjuacy@yahoo.com.br
Fonte: https://www.ecodebate.com.br/2021/10/29/cop-26-apenas-mais-uma-conferencia-do-clima/
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