Mudar um modelo econômico baseado no petróleo não é “simplesmente” trocartermoelétricas por hidrelétricas e botar etanol no tanque dos veículos, em lugar degasolina. É preciso substituir também uma grande quantidade de derivados de petróleoutilizados como matéria prima nas mais diversas indústrias.
Um desses derivados é a glicerina, um composto sem cor e sem cheiro com o qual se faz de sabonetes e detergentes a batons e sombras, passando por lubrificantes de equipamentos que entram em contato com alimentos. Ocorre que na fabricação dobiodiesel – assim como na fabricação do diesel – também se produz glicerina. São cerca de 10 toneladas de glicerina para cada 90 toneladas do biodiesel feito com óleo de dendê ou de soja.
“A tendência é de produzir grandes quantidades de glicerina, pois já aumentamos o porcentual de biodiesel misturado ao diesel de 5% para 6%, em julho, e vamos chegar a 7% em novembro!, observa a engenheira química e doutora em Tecnologia de Processos Bioquímicos, Mônica Damaso, pesquisadora da Embrapa Agroenergia, de Brasília. Ela é parte de uma equipe de 20 pesquisadores e técnicos dedicados à prospecção de microrganismos capazes de transformar a glicerina em poliois, como o xilitol, por exemplo, um polímero orgânico usado na indústria alimentícia como edulcorante (adoçante) e também na produção de pasta de dentes, pois ajuda a combater as cáries. Ou butanodiol, matéria prima de várias sínteses químicas: plásticos, soluções anticongelantes, preparações de solventes, aditivo de combustível líquido, borrachas sintéticas, aromatizantes. Ou ainda o ácido lático, que serve de base para resinas de poliéster e poliuretano ou solventes verdes para revestimento e para a indústria de limpeza.
Em resumo, dá para fazer muitas coisas com a glicerina, quando se tem o microrganismo certo para cada bioconversão. O foco da pesquisa de Mônica Damaso são os fungos filamentosos. Após testar várias linhagens de espécies nativas, isoladas do azeite de dendê, ela já tem algumas alternativas promissoras, embora ainda não possa revelar seus nomes científicos por questões de propriedade intelectual.
Outro pesquisador da Embrapa Agroenergia, o biólogo e doutor em Microbiologia Aplicada, João Ricardo Moreira de Almeida, trabalha com bactérias e leveduras. O propósito é o mesmo – transformar a glicerina – mas os produtos são diferentes. As leveduras mais promissoras por ele estudadas são oriundas do Cerrado, da Amazônia e isoladas da cana-de-açúcar.
O maior desafio da equipe é desenvolver processos de produção em maior escala, para converter a glicerina em produtos comerciais. Eles se concentrarão nisso, nos próximos 3 anos, com apoio da Embrapa Recursos Genéticos, da Embrapa Meio Ambiente e doInstituto Militar de Engenharia (IME) – fieis depositários das coleções de microrganismos – e com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
A ideia é tentar o melhoramento genético dos microrganismos selecionados (para que cresçam menos e produzam mais) ou promover alterações no processo de cultivo dos microrganismos (variações do pH, da quantidade de oxigênio etc). Com isso esperam aumentar a produtividade a partir da mesma glicerina e obter mais rendimento no processo. A aplicação dos derivados obtidos após a transformação é bem tranquila, pois a indústria já utiliza rotineiramente os compostos de base petróleo. Só que estes teriam fonte renovável: o biodiesel.
Fotos: Monica Damaso (ao alto fungo filamentoso na glicerina)
Vivian Chies (acima, leveduras na glicerina)
Vivian Chies (acima, leveduras na glicerina)
Fonte: http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/biodiversa/a-hora-e-vez-das-glicerinas-transformistas/?utm_source=redesabril_psustentavel&utm_medium=facebook&utm_campaign=redesabril_psustentavel_biodiversa
Nenhum comentário:
Postar um comentário