segunda-feira, 20 de maio de 2013

"Existem barreiras e desincentivos à adoção de melhores práticas"



O Brasil possui 17% de seu território – 140 milhões de hectares – em pastagens degradadas. Só na Amazônia, pastagens com grau avançado de degradação equivalem ao tamanho do Reino Unido. Praticamente toda essa área poderia ser recuperada. Em vez disso, o que percebemos é o inverso: apesar de iniciativas públicas e privadas no sentido de combater a cultura do desmatamento, segue-se avançando sobre a floresta nativa em um ritmo ainda veloz.  


Os resultados são desastrosos para o clima e para a própria produção. “É marcante o fato de que a produtividade média da pecuária, na região, está abaixo do potencial – gira em torno de 80 kg de carne por hectare, por ano, enquanto que o potencial é de 300 kg”, explica o engenheiro florestal e pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Paulo Barreto. 

O cenário é de alerta, mas já existem ações, tanto públicas quanto privadas, consideradas positivas no tratamento da questão. É o que Barreto avalia, na entrevista que concedeu ao Observatório do Plano ABC, a seguir:   

Qual o perfil da agropecuária na Amazônia, hoje?

A agropecuária na Amazônia é bastante diversificada em termos de produtos (desde cupuaçu, cacau, carne e soja) e de tipos de produtores (grandes, pequenos, empresariais e familiares). Uma característica mercante é fato de que a maior parte da área desmatada (em torno de 60% a 70%) esteja destinada a pastos, para a pecuária bovina. É ainda mais marcante o fato de que a produtividade média da pecuária esteja muito abaixo do potencial – ou seja, a média fica em torno de 80 kg de carne por hectare, por ano, enquanto que o potencial é de, pelo menos, 300 kg/ha/ano. 

No estudo lançado, recentemente, pelo Imazon, “Como desenvolver a economia rural sem desmatar a Amazônia”, vocês apontam que, desde 2007, já vem acontecendo o combate ao desmatamento, com o crescimento da economia rural da região. Quais as principais mudanças que ocorreram nos últimos seis anos?

Várias iniciativas públicas e privadas contribuíram para reduzir o desmatamento. Em 2006, o Greenpeace realizou campanha contra a produção de soja em áreas desmatadas ilegalmente. Isso levou grandes compradores de soja e seus produtos a se comprometerem a não comprar destas áreas. Desde então, o acordo vem sendo renovado. 

Desde 2008, o governo passou a fiscalizar de forma mais eficaz, concentrando-se nos municípios com maiores taxas de desmatamento e nas maiores áreas desmatadas. Além disso, passou a priorizar a penalização efetiva, indo além das multas (que, geralmente, não são pagas). As novidades foram: confiscar e leiloar ou doar gado, grãos e madeira oriundos de áreas desmatadas ou exploradas ilegalmente; embargar áreas desmatadas ilegalmente e disponibilizar a lista destas áreas na internet; tornar passível de punição as empresas que compram produtos destas áreas. 

Em 2009, o Ministério Público Federal e o Ibama processaram frigoríficos no Pará que compraram de áreas embargadas e alertou os compradores destes frigoríficos que também poderiam ser processados, se mantivessem a prática. Isso forçou os frigoríficos a se comprometerem a comprar apenas de fazendeiros que iniciassem a regularização ambiental de suas fazendas, o que gerou queda mais rápida do desmatamento, na região, em relação aos outros estados. Outras ações iniciadas em 2010 levaram outros frigoríficos, no Acre e Mato Grosso, a assinarem acordos similares.

Neste mesmo estudo, vocês demonstram que seria possível suprir o aumento da demanda de carne projetada até 2022, ampliando-se a produtividade em torno de apenas 24% do pasto com potencial agronômico para a intensificação existente em 2007. O que é preciso fazer para garantir que isso efetivamente aconteça?

Alguns fazendeiros já estão adotando melhores práticas que aumentam a produtividade, o que inclui o uso de técnicas apropriadas (pastejo rotacionado, adubação do pasto, etc.), investimento na infraestrutura da fazenda e treinamento de pessoal. 

Para suprir a demanda projetada, seria necessário que a maioria dos fazendeiros adotasse estas práticas. Porém, existem barreiras e desincentivos à sua adoção, como escassez de pessoal qualificado e falta de titulação de terras, o que desencoraja investimentos de longo prazo. Ademais, muitos fazendeiros ainda desconhecem as melhores práticas. Portanto, para estimular os investimentos, será necessário capacitação tanto de proprietários de terras como de funcionários e realizar a titulação de terras.

Há conhecimento, na região amazônica, sobre o Plano ABC, seus objetivos, em particular a respeito da importância da recuperação das pastagens degradadas para a redução das emissões brasileiras?

O Plano ABC ainda é relativamente pouco conhecido. 

E o Programa ABC? Qual o status da utilização dessa linha de crédito na Amazônia?
A utilização ainda é baixa. Por exemplo, na safra 2011-12 o crédito ABC no Pará chegou a cerca de R$ 24 milhões, que foi equivalente a apenas 4,5% do crédito rural total que o Pará usou na safra 2009. O próprio governo federal reconheceu, recentemente, que é preciso atuar para que o programa seja mais utilizado no Pará e Mato Grosso, nos quais existem grande extensões de pastos mal utilizados.

Qual a sua avaliação sobre as metas do Plano Estadual do ABC, recentemente lançado pelo Estado do Pará?

O plano considera várias atividades relevantes, desde o aproveitamento de dejetos animais para gerar energia, reflorestamento e a recuperação de pastos degradados. Entretanto, algumas metas parecem otimistas demais para as condições atuais – por exemplo, pretende-se chegar a 100 mil hectares de pastos recuperados, até 2015. 

Quais são as principais oportunidades e entraves para a execução desse plano?


As oportunidades seriam: a pressão contra o desmatamento – tanto das políticas como do mercado - tem aumentado a consciência de líderes do setor rural de que o aumento da produção deverá ser por meio do aumento produtividade; projetos-piloto e fazendas-modelo que demonstram as melhores práticas a serem utilizadas. Os entraves seriam: baixo número de profissionais capacitados; falta de titulação de terras que inibem investimentos (esse fator é, inclusive, reconhecido pela Secretaria de Agricultura do Pará no seu Plano Estadual).

Qual o trabalho conduzido pelo Imazon voltado à implementação do Plano e do Programa ABC no Pará?

O Imazon contribui com um conjunto de ações que envolve treinamento para projetistas, operadores do crédito rural e proprietários rurais (incluindo dias de campo); preparação de cartilha informativa; desenvolvimento de um prêmio para os operadores de crédito que conseguirem estimular a adoção das práticas ABC; e revisão das regras do programa, no sentido de contribuir para que sua adoção na região seja facilitada. 


fonte: http://www.institutocarbonobrasil.org.br/?id=734000

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