quarta-feira, 27 de novembro de 2013

COP19: poucos avanços, acordo mínimo e lobbies do setor privado. Entrevista com Camila Moreno

“No final de 2015 os países devem acordar um novo regime internacional, que entrará em vigor a partir de 2020. Este novo acordo deve estabelecer obrigações de redução de emissões válidas para todos os países, sucedendo o Protocolo de Kyoto”, diz a pesquisadora.



“É flagrante a ocupação do espaço da convenção por lobbies de grandes empresas poluidoras e do chamado ao setor privado (aos mercados, investidores e da oportunidade de negócios com o clima), que é referendada e levada adiante pela própria Organização das Nações Unidas – ONU, como se viu no painel de alto nível (high level pannel) sobre abordagens de mercado para ação fortalecida (market approach for enhanced action), com um discurso do próprio Ban Ki Moon, secretário geral daONU.”
A declaração é da pesquisadora Camila Moreno, que participou da 19ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro da Organização das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – COP-19, em Varsóvia, na Polônia. A conferência, que aconteceu entre os dias 11 e 22 de novembro, tinha como meta preparar as bases do acordo que substituirá o Protocolo de Kyoto na Conferência a ser realizada em Paris, em 2015.
Entretanto, o evento “terminou com poucos avanços” e “um acordo mínimo”: “até o final do primeiro trimestre de 2015, os países com condições para tanto (‘in a position to do so’) devem definir suas metas voluntárias de redução de emissões para que estas sejam comunicadas à Convenção”, informa em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail.
De acordo com Camila, “os próximos dois anos serão cruciais para cumprir com os objetivos de fechar este novo acordo. Porém, como foi visto em Varsóvia, neste caminho os países ‘desenvolvidos’ estão fazendo um esforço coordenado, para com isso também abandonar princípios fundamentais da Convenção e, ao colocar todos os países no mesmo barco, tentam diluir de todas as formas o ‘princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas’, um dos pilares do debate do tema no plano internacional desde a sua instauração”.
Camila Moreno é pesquisadora da área ambiental e acompanha a Convenção do Climadesde 2008. Participou em Varsóvia representando o Grupo Carta de Belém e viajou com o apoio da Fundação Heinrich Boell – Brasil, na qual atua como coordenadora de sustentabilidade.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Que avaliação faz da COP-19?
Foto: http://bit.ly/J8HLw6
Camila Moreno - A captura corporativa desta COP foi objeto de muita denúncia no período que a antecedeu e também durante as duas semanas de negociação, com um informe e várias ações organizadas pela sociedade civil.
É flagrante a ocupação do espaço da convenção por lobbies de grandes empresas poluidoras e do chamado ao setor privado (aos mercados, investidores e da oportunidade de negócios com o clima), que é referendada e levada adiante pela própria Organização das Nações Unidas – ONU, como se viu no painel de alto nível (high level pannel)sobre abordagens de mercado para ação fortalecida(market approach for enhanced action), com um discurso do próprio Ban Ki Moon, secretário geral daONU.
IHU On-Line – Quais temas foram discutidos na COP-19?
Camila Moreno - A COP-19, realizada entre 11 e 22 de novembro em Varsóvia, na Polônia, terminou com poucos avanços, mas que garantem oficialmente a continuidade do processo que deve, até o final de 2015, na COP-21, em Paris, definir as regras para um novo acordo global sobre o clima.
Com negociações estendendo-se madrugadas adentro durante toda a segunda semana, foi somente na madrugada de domingo, dia 24, que um acordo mínimo ficou delineado: até o final do primeiro trimestre de 2015, os países com condições para tanto (‘in a position to do so’) devem definir suas metas voluntárias de redução de emissões para que estas sejam comunicadas à Convenção.
Este é um passo considerado fundamental para o primeiro esboço do texto de negociação que idealmente deve estar pronto em maio de 2015, antes da reunião intersessional que acontece anualmente em junho. As “condições” para que os países submetam estas metas não envolvem apenas a “vontade política”. Há um grande investimento, que também depende de acesso à tecnologia (como monitoramento satelital, por exemplo) e capacidades na quantificação dos gases, produção de inventários, colocação em marcha de sistemas nacionais de registro e contabilidade para medir, reportar e verificar as reduções. O acordo sobre as regras metodológicas para receber a “result based finance” (financiamento ou pagamentos baseados em resultados) é uma questão fundamental para esta arquitetura do financiamento do clima e da chamada economia de baixo carbono. Um exemplo foi o fechamento em Varsóvia de um “pacote” de regras metodológicas para as ações de REDD+, depois de oito anos negociando o tema (desde que a proposta de redução compensada de emissões foi introduzida na COP em 2005).
No final de 2015 os países devem acordar um novo regime internacional, que entrará em vigor a partir de 2020. Este novo acordo deve estabelecer obrigações de redução de emissões válidas para todos os países, sucedendo o Protocolo de Kyoto. De acordo com Kyoto, as obrigações vinculantes se aplicam somente para os países desenvolvidos, ou seja, aqueles que mais teriam contribuído historicamente com as emissões de gases que causaram o efeito estufa, principal causa atribuída das mudanças climáticas e do aumento da temperatura média do planeta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário