sábado, 14 de setembro de 2013

Térmicas a carvão: mal desnecessário, por Renata Camargo e Renata Nitta

térmica a carvão

Depois de quatro anos fora dos leilões de energia, o carvão volta à cesta de compras das concessionárias na rodada de leilão A-5, em 29 de agosto. Dos 3.535MWh habilitados no leilão, 8.840MWh são de térmicas a carvão.
Em 2009, o próprio governo federal baniu o carvão dos leilões, por considerá-lo fonte altamente poluidora, com impactos diretos na qualidade do ar e nas emissões de gases de efeito estufa. A explicação para a retomada é a segurança energética do país.

Com uma matriz muito dependente de hidrelétricas — 67% da capacidade instalada em 2011 — e a falta de uma política integrada para novas renováveis, o governo decidiu diversificar a matriz energética com energia suja. Entre todas as fontes de energia disponíveis, não poderia ter escolhido uma mais inapropriada. A queima de carvão está diretamente associada a problemas como smog (nevoeiro contaminado por fumaças), chuva ácida e mudanças climáticas.
Segundo dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), o carvão emite 84 vezes mais CO2 que a energia eólica e 22 vezes mais que a energia solar. Se todas as usinas térmicas fósseis (carvão e gás) forem contratadas no leilão, mesmo operando a 50% do tempo, elas emitirão 15 milhões de toneladas de CO2 por ano, o equivalente a toda a emissão da cidade de São Paulo em 2011, segundo cálculos do consultor Tasso Azevedo.
A simples troca de hidrelétrica por térmicas a carvão é a retroalimentação de um falso dilema, que se baseia em achar que o Brasil não tem outras fontes alternativas de energia. De fato, não é desejável que a matriz energética brasileira siga na dependência de uma única fonte. Mas o governo e o setor elétrico precisam entender que diversificar a matriz energética nacional significa investir em fontes seguras, limpas e renováveis, nas quais o Brasil tem potencial de sobra, como solar, eólica e biomassa.
Para a solar, as condições são invejáveis, com ótimos índices de radiação e pouca variação entre as estações do ano. Se aproveitássemos entre 5% e 10% do potencial, seria o suficiente para atender toda a demanda nacional de energia. A Alemanha, por exemplo, país muito menos favorecido pelo Sol, já consegue atender cerca de 4% de sua demanda total de eletricidade somente com a fonte solar. Nos Estados Unidos, essa é a fonte que mais cresce, a uma taxa de 50% nos últimos anos. O aumento da produção fez com que seu preço caísse, em média, 9% ao ano em todo o mundo.
Há 10 anos, a capacidade de geração de energia solar fotovoltaica no mundo era de apenas 2,8 gigawatts. Hoje, essa capacidade superou a barreira dos 100GW, e a indústria prevê que a capacidade global de geração de solar dobre até 2016. Enquanto isso, o potencial de geração eólica é superior a 300 mil MW, ou seja, mais do que o dobro da atual capacidade instalada no país (115 mil MW) e maior do que o potencial remanescente de energia hidrelétrica (260 mil MW).
A energia vinda dos ventos cresceu 10 vezes no Brasil entre 2007 e 2013 e hoje já corresponde a 2% da nossa matriz. A explosão da produção eólica no país criou um círculo virtuoso, fazendo com que o preço caísse da faixa dos R$ 300/MWh para menos de R$ 100/MWh em 2012, tornando-a altamente competitiva.
Ao contrário do que alguns críticos colocam, as fontes renováveis são seguras e têm toda a capacidade de complementar nosso sistema. Além disso, a possibilidade que as renováveis oferecem de se gerar energia perto dos centros consumidores torna mais segura sua distribuição, evitando apagões como os que atingiram as regiões Norte e Nordeste em outubro do ano passado e outro em dezembro, quando mais de 3,5 milhões de pessoas no Brasil ficaram sem energia.
Não se justifica o país voltar ao passado e seguir no caminho de retrocesso ambiental. Investir na geração de energia térmica a carvão não é estratégico, nem garante a segurança energética de que os brasileiros tanto precisam. Descentralizar a geração de energia, investir em novas tecnologias e priorizar políticas de eficiência energética é o norte que o Brasil deve seguir. O carvão é um mal desnecessário.
Renata Camargo, Coordenadora de políticas públicos do Greenpeace Brasil e Renata Nitta, Campanha de Clima e Energia do Greenpeace Brasil
Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense e socializado pelo ClippingMP.

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