Um novo modelo de desenvolvimento é o que se busca
O Fórum Social Temático (FST), realizado na cidade de Porto Alegre, recebeu o seminário ‘Cidades Sustentáveis’ e congregou um grupo seleto de palestrantes que se entregou à discussão do que é de fato a sustentabilidade.
Tanto a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, quanto Jorge Abrahão, presidente do Instituto Ethos, ressaltaram que nos encontramos em meio a diversas crises: social, financeira, ambiental, mas principalmente ética.
E neste momento, ressalta Abrahão, é que podemos buscar os caminhos para construir juntos as diretrizes de um novo paradigma para a sociedade. “É uma grande oportunidade, é o que a Rio +20 deve nos oferecer”.
Para ele, uma das razões da crise atual é o nosso imaginário: individualista e de curto prazo. A falta de visão de longo prazo se tornou generalizada, entre o Estado, empresas e cidadãos e para agravar ainda mais, o setor corporativo passou a ser maior que muitos Estados, trazendo o interesse privado para o foco da gestão pública, comentou Abrahão.
Neste sentido, Marina sugere que o ideal do desenvolvimento sustentável precisa ter suas bases em uma nova forma de ‘Ser’. Há que se resolver todas essas crises que vivemos sem perder o foco que tudo surge de uma única crise, o “impasse civilizatório”, completa a ambientalista.
Ela defende que a solução está no desapego de conceitos arraigados, ou em uma “descontinuidade produtiva”, primeiramente reduzindo o consumo, logo após isso inserindo novas fontes na matriz energética.
“A realidade responde na língua que é perguntada, nós é que somos monoglotas”, diz Marina se referindo a nossa necessidade de pensar outras formas de se viver que não seja a perpetuação do modelo depredatório atual.
A participação da sociedade é um requisito elementar para a construção de um novo modelo, um exemplo é o Movimento Nossa São Paulo, que a partir do compromisso do atual prefeito Kassab com o programa ‘Cidades Sustentáveis’ criou uma série de mais de 200 metas e indicadores, segundo Abrahão.
Com o sentimento da população que as metas não estavam sendo atendidas, a mídia iniciou um trabalho de pressão sobre o prefeito que resultou em uma queda na sua aprovação popular.
Em seu novo livro ‘ Sustentabilidade – O que é e o que não é’, o Teólogo Leonardo Boff busca desvendar este termo às vezes tão mal empregado.
A sustentabilidade é “facilmente usada como adjetivo e não como substantivo”, confronta Boff explicando que as empresas focam na competitividade e atualização, mas não enxergam as injustiças sociais, degradação ambiental e o modo de ser que ajudam a perpetuar.
Em sua análise, Boff não encontrou sequer uma definição da ONU que inclua algo além do homem em seu cerne.
“A crise do modelo vigente, que põe o homem fora e acima da natureza levou a um impasse, a idéia era ter um desenvolvimento infinito e hoje nos damos conta que já encostamos nos limites ... a saída é buscar um novo paradigma, que já tem um século de discussão nas ciências da vida, física quântica e tantas outras”.
Como exemplo de modelo a se seguir ele indica a ‘Carta da Terra’ http://www.cartadaterrabrasil.org/, resultado de uma década de diálogo intercultural, em torno de objetivos comuns e valores compartilhados.
A missão da Iniciativa da Carta da Terra é promover a transição para formas sustentáveis de vida e de uma sociedade global fundamentada em um modelo de ética compartilhada, que inclui o respeito e o cuidado pela comunidade da vida, a integridade ecológica, a democracia e uma cultura de paz.
À luz desta legitimidade, um crescente número de juristas internacionais reconhece que a Carta da Terra está adquirindo um status de lei branca (“soft law”). Leis brancas, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos são consideradas como moralmente, mas não juridicamente obrigatórias para os Governos de Estado, que aceitam subscrevê-las e adotá-las, e muitas vezes servem de base para o desenvolvimento de uma lei stritu senso (hard law).
"(Um novo começo) requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal", conclama a Carta da Terra.
Veterano do movimento socioambientalista brasileiro, presente na Rio-92 há 20 anos, Jean-Pierre Leroy revela uma preocupação: “O discurso da economia verde chega com uma força muito grande, como se fosse a única alternativa para o futuro. O problema é que aqueles que esmagaram os povos e estragaram os territórios são os mesmos que se apresentam como a solução do problema ambiental. Mas, a gente pergunta o que eles fizeram desde a Rio-92, e a resposta é nada. Não resolveram nada nesses 20 anos e vão resolver agora para o futuro? Esse discurso foi adotado pelos economistas e pela tecnocracia, e não há um debate social sobre isso. Ou se propõe outro modelo econômico ou essa economia, mesmo esverdeada, não tem futuro”, diz.
Mal o ano começou e as críticas a conferência da ONU já são muitas. Tasso Azevedo, ex-diretor de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, disse que o documento divulgado pelas Nações Unidas, que esboça a resolução a ser votada na conferência, é “certinho”.
“Existindo ou não, não faz diferença hoje”, comentou enfatizando que o texto apresenta extrema dificuldade em lidar com a realidade que há limites para o nosso crescimento. Outro defeito, segundo ele, é a conexão entre pobreza e desenvolvimento sustentável, sendo que o texto coloca a primeira como condicionante do último. O documento também não lida com o tema das desigualdades sociais, critica.
“Tenho minhas dúvidas que os chefes de estado do G8 darão importância à Rio +20”, enfatizou Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, conclamando a sociedade a pressionar os líderes a comparecer.
Ele diz que a conferência deve ser um grande evento de mobilização social, mas que lembra que este ano outro evento importante merece atenção da população: as eleições municipais.
“Temos que detonar crescente o preconceito que devemos torcer o nariz para a política. Quem tem nojo de política é governado por quem não tem”, ressalta sugerindo que cada um de nós faça uma pauta de compromisso para ser cobrada dos candidatos eleitos.
“Se a gente não participa as coisas não acontecem”, convocou o economista Ladislau Dowbor.
Vídeo: Cobertura da marcha de abertura do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre / #florestafazadiferenca #vetadilma!
As cidades, abrigando 85% da população brasileira e mais de 50% da global, são os locais mais apropriados para discutir e construir um novo paradigma para a sociedade alcançar o verdadeiro desenvolvimento sustentável e superar as crises atuais
O Fórum Social Temático (FST), realizado na cidade de Porto Alegre, recebeu o seminário ‘Cidades Sustentáveis’ e congregou um grupo seleto de palestrantes que se entregou à discussão do que é de fato a sustentabilidade.
Tanto a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, quanto Jorge Abrahão, presidente do Instituto Ethos, ressaltaram que nos encontramos em meio a diversas crises: social, financeira, ambiental, mas principalmente ética.
E neste momento, ressalta Abrahão, é que podemos buscar os caminhos para construir juntos as diretrizes de um novo paradigma para a sociedade. “É uma grande oportunidade, é o que a Rio +20 deve nos oferecer”.
Para ele, uma das razões da crise atual é o nosso imaginário: individualista e de curto prazo. A falta de visão de longo prazo se tornou generalizada, entre o Estado, empresas e cidadãos e para agravar ainda mais, o setor corporativo passou a ser maior que muitos Estados, trazendo o interesse privado para o foco da gestão pública, comentou Abrahão.
Neste sentido, Marina sugere que o ideal do desenvolvimento sustentável precisa ter suas bases em uma nova forma de ‘Ser’. Há que se resolver todas essas crises que vivemos sem perder o foco que tudo surge de uma única crise, o “impasse civilizatório”, completa a ambientalista.
Ela defende que a solução está no desapego de conceitos arraigados, ou em uma “descontinuidade produtiva”, primeiramente reduzindo o consumo, logo após isso inserindo novas fontes na matriz energética.
“A realidade responde na língua que é perguntada, nós é que somos monoglotas”, diz Marina se referindo a nossa necessidade de pensar outras formas de se viver que não seja a perpetuação do modelo depredatório atual.
A participação da sociedade é um requisito elementar para a construção de um novo modelo, um exemplo é o Movimento Nossa São Paulo, que a partir do compromisso do atual prefeito Kassab com o programa ‘Cidades Sustentáveis’ criou uma série de mais de 200 metas e indicadores, segundo Abrahão.
Com o sentimento da população que as metas não estavam sendo atendidas, a mídia iniciou um trabalho de pressão sobre o prefeito que resultou em uma queda na sua aprovação popular.
Afinal o que é sustentabilidade?
O novo modelo para a nossa sociedade até poderia ser o que vem sendo chamado de ‘capitalismo verde’, porém aprofundando um pouco mais as raízes deste conceito surgem questionamentos se isto realmente é possível.Em seu novo livro ‘ Sustentabilidade – O que é e o que não é’, o Teólogo Leonardo Boff busca desvendar este termo às vezes tão mal empregado.
A sustentabilidade é “facilmente usada como adjetivo e não como substantivo”, confronta Boff explicando que as empresas focam na competitividade e atualização, mas não enxergam as injustiças sociais, degradação ambiental e o modo de ser que ajudam a perpetuar.
Em sua análise, Boff não encontrou sequer uma definição da ONU que inclua algo além do homem em seu cerne.
“A crise do modelo vigente, que põe o homem fora e acima da natureza levou a um impasse, a idéia era ter um desenvolvimento infinito e hoje nos damos conta que já encostamos nos limites ... a saída é buscar um novo paradigma, que já tem um século de discussão nas ciências da vida, física quântica e tantas outras”.
Como exemplo de modelo a se seguir ele indica a ‘Carta da Terra’ http://www.cartadaterrabrasil.org/, resultado de uma década de diálogo intercultural, em torno de objetivos comuns e valores compartilhados.
A missão da Iniciativa da Carta da Terra é promover a transição para formas sustentáveis de vida e de uma sociedade global fundamentada em um modelo de ética compartilhada, que inclui o respeito e o cuidado pela comunidade da vida, a integridade ecológica, a democracia e uma cultura de paz.
À luz desta legitimidade, um crescente número de juristas internacionais reconhece que a Carta da Terra está adquirindo um status de lei branca (“soft law”). Leis brancas, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos são consideradas como moralmente, mas não juridicamente obrigatórias para os Governos de Estado, que aceitam subscrevê-las e adotá-las, e muitas vezes servem de base para o desenvolvimento de uma lei stritu senso (hard law).
"(Um novo começo) requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal", conclama a Carta da Terra.
Novo modelo
Em vários debates do FST, os 'capitalismo verde' foi alvo de duras criticas.Veterano do movimento socioambientalista brasileiro, presente na Rio-92 há 20 anos, Jean-Pierre Leroy revela uma preocupação: “O discurso da economia verde chega com uma força muito grande, como se fosse a única alternativa para o futuro. O problema é que aqueles que esmagaram os povos e estragaram os territórios são os mesmos que se apresentam como a solução do problema ambiental. Mas, a gente pergunta o que eles fizeram desde a Rio-92, e a resposta é nada. Não resolveram nada nesses 20 anos e vão resolver agora para o futuro? Esse discurso foi adotado pelos economistas e pela tecnocracia, e não há um debate social sobre isso. Ou se propõe outro modelo econômico ou essa economia, mesmo esverdeada, não tem futuro”, diz.
Rio+20
Tudo indica que os debates devem esquentar ainda mais durante a realização da Rio +20, quando também será realizada a Cúpula dos Povos, evento paralelo organizado pela sociedade civil que até agora já tem confirmada a presença de cerca de 10 mil pessoas.Mal o ano começou e as críticas a conferência da ONU já são muitas. Tasso Azevedo, ex-diretor de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, disse que o documento divulgado pelas Nações Unidas, que esboça a resolução a ser votada na conferência, é “certinho”.
“Existindo ou não, não faz diferença hoje”, comentou enfatizando que o texto apresenta extrema dificuldade em lidar com a realidade que há limites para o nosso crescimento. Outro defeito, segundo ele, é a conexão entre pobreza e desenvolvimento sustentável, sendo que o texto coloca a primeira como condicionante do último. O documento também não lida com o tema das desigualdades sociais, critica.
“Tenho minhas dúvidas que os chefes de estado do G8 darão importância à Rio +20”, enfatizou Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, conclamando a sociedade a pressionar os líderes a comparecer.
Ele diz que a conferência deve ser um grande evento de mobilização social, mas que lembra que este ano outro evento importante merece atenção da população: as eleições municipais.
“Temos que detonar crescente o preconceito que devemos torcer o nariz para a política. Quem tem nojo de política é governado por quem não tem”, ressalta sugerindo que cada um de nós faça uma pauta de compromisso para ser cobrada dos candidatos eleitos.
“Se a gente não participa as coisas não acontecem”, convocou o economista Ladislau Dowbor.
Vídeo: Cobertura da marcha de abertura do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre / #florestafazadiferenca #vetadilma!
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