terça-feira, 27 de março de 2012


Tipificação criminal para proteção das águas?

* Por Renata Franco de Paula Gonçalves Moreno

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Discussões envolvendo qualidade da água e vida estão presentes nos mais diversos âmbitos institucionais, educacionais, políticos e sociais do planeta. Isto porque mais de um bilhão de pessoas não têm acesso à água de boa qualidade, ou mesmo à quantidade suficiente para uma vida digna e saudável, o que acaba por provocar a morte de aproximadamente um milhão e meio de pessoas que poderiam ser salvas por ano apenas com o fornecimento de água potável e saneamento básico.

Estas questões se tornam mais evidentes com a crescente expansão demográfica e industrial observada nas últimas décadas, trazendo como conseqüência o comprometimento das águas dos rios, lagos e reservatórios.
Na maioria das vezes, a poluição das águas é gerada por: (i) efluentes domésticos (poluentes orgânicos biodegradáveis, nutrientes e bactérias), (ii) efluentes industriais (poluentes orgânicos e inorgânicos, dependendo da atividade industrial) e (iii) carga difusa urbana e agrícola (poluentes advindos da drenagem destas áreas: fertilizantes, defensivos agrícolas, fezes de animais e material em suspensão).
Existe uma discussão quanto a eventual falta de normatização específica na Lei de Crimes Ambientais, para a poluição dos recursos hídricos. De fato, não há um código penal que institua como crime a poluição da água no país, uma vez que não há tipificação expressa na Lei dos Crimes Ambientais. No entanto, o artigo 54 da Lei de Crimes Ambientais traz em seu caput o crime de poluição, em sentido amplo: “Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.”
A conduta incriminada é causar, originar, produzir, provocar, ocasionar poluição de qualquer natureza, desde que sejam ou possam ser produzidos danos à saúde humana, à fauna ou à flora, restando presente também a tipificação do crime de perigo de dano à saúde ou ao meio ambiente.
Assim, quando o legislador se utilizou do chamado tipo penal aberto, foi objetivando punir a conduta de causar poluição visual, sonora, hídrica, atmosférica, solo, etc., ou seja, toda e qualquer tipo de poluição.
No tocante, especificamente, à poluição hídrica, o legislador optou por proteger toda e qualquer modificação das características do ambiente aquático, de modo a torná-lo impróprio às formas de vida que normalmente abriga, como por exemplo, o lançamento de efluentes industriais ao longo do Rio Tietê, Rio Pinheiros, dentre outros, que muito embora já poluídos, qualquer incremento no lançamento de poluição hídrica agrava significativamente a condição e qualidade do corpo hídrico receptor.
A existência de legislação ambiental específica traz maior proteção e segurança aos Recursos Hídricos e ao meio ambiente. No entanto, é necessário também ações de preservação, controle e utilização racional das águas, por meio de uma boa gestão, bem como um plano que contemple os múltiplos usos deste recurso. Por este motivo, ações governamentais instituindo a cobrança pelo uso da água, muitas vezes contestada pela maioria da população, são de extrema importância para a preservação e manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A cobrança pelo uso da água tem o intuito de, primeiramente, reconhecer a água como um bem público de valor econômico, indicando ao usuário o real valor deste bem. Além disso, busca incentivar o uso racional e sustentável da água, obtendo recursos financeiros para financiamento de programas e investimentos na bacia. Somente assim, com a integração das ações de proteção ambiental será possível conferir maior proteção aos Recursos Hídricos Brasileiros.
(*) Renata Franco é associada do escritório Emerenciano, Baggio e Associados, desenvolvendo trabalhos de consultoria ambiental para grandes empresas nacionais e internacionais. Graduada em Direito pela Universidade São Francisco, ela foi por dois anos consecutivos escolhida pelo Prêmio Análise Advocacia como uma das advogadas mais admiradas na área de Meio Ambiente no Brasil.

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