domingo, 8 de julho de 2012

Compreenda os resultados da Rio+20

Entre os dias 13 a 22 de junho foi realizada, no Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), com o objetivo de estabelecer uma agenda planetária comum para estimular novas medidas rumo a uma “economia verde” que freie a degradação do meio ambiente, combata a pobreza e promova a inclusão social. Em suma, o dito, “desenvolvimento sustentável”.


Apesar de todas as expectativas, a Rio+20 terminou com uma declaração classificada por diplomatas, chefes de Estado, e ONGs como “pouco ambiciosa”. Denominada “O Futuro que Queremos”  a declaração foi dividida em seis capítulos e 283 itens, redigida de forma abrangente e genérica. Aponta diversos problemas estruturais no modelo de desenvolvimento predatório existente, mas sem definir responsáveis ou ações claras para suas soluções. Há poucas decisões ali, a não ser vagas declarações de preocupações com o futuro do planeta. 

Ao longo de todas as páginas fica claro que desenvolvimento não é o mesmo que crescimento econômico, e que a redução das desigualdades sociais é matriz essencial para o chamado desenvolvimento sustentável. “O futuro que queremos” advoga “a mudança de padrões insustentáveis de produção e consumo”. E aponta como alternativa a “promoção da gestão sustentável e integrada dos recursos naturais”, para que se criem maiores oportunidades para todos, reduzindo as desigualdades. Contudo, quando fala em “economia verde”, o documento final não explica o que significa o conceito. Isso faz com que sua enfática defesa ao longo de treze parágrafos dependa de detalhes mais explícitos sobre o que se pretende.

A seguir, é transcrito o que era esperado pela sociedade e o que a Rio+20 produziu na prática:

Economia Verde
Esperado –  Estabelecer as normas de transição da “economia marrom” para a "economia verde", para que os países assumam novos padrões de produção, consumo e comercialização que promovam o bem-estar humano, a equidade social e a redução dos riscos ambientais, levando a um caminho comum para o desenvolvimento sustentável.

Resultado – Houve grandes divergências de interpretação e compreensão entre países desenvolvidos e os em desenvolvimento, quanto ao conceito de economia verde. Economia verde aparece no texto final como um dos “instrumentos” para o desenvolvimento sustentável, mas para evitar controvérsias, foram colocadas recomendações gerais, sem definir conceitos e metas. O acordo reafirmou que cada país poderia seguir seu próprio caminho para alcançar uma "economia verde”.

Subsídios a combustíveis fósseis
Esperado - Definir um compromisso para os países eliminarem subsídios aos combustíveis fósseis, de forma gradual até 2020, contribuindo para reduzir a demanda de energia global em 5% e as emissões de dióxido de carbono em quase 6%.

Resultado - O texto da Rio+20 reafirmou compromissos anteriores de países de "eliminar gradualmente subsídios a combustíveis fósseis ineficazes e prejudiciais que encorajam o desperdício". Mas não chegou a reforçar o compromisso voluntário com prazos ou mais detalhes.

Fortalecimento do Pnuma
Esperado – Que o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) se tornasse uma agência com mais poderes e autonomia, como a Organização Mundial da Saúde - OMS.

Resultado - Países concordaram em “fortalecer” e promover “mudança de patamar” do PNUMA, mas não o transforma em agência. O acordo propôs que na Assembleia Geral da ONU, em setembro de 2012, seja adotada uma resolução "reforçando e aprimorando" o órgão. Propôs dar ao Pnuma "recursos adequados, estáveis, seguros e financeiros crescentes" do orçamento das Nações Unidas e de contribuições voluntárias para ajudá-la a cumprir sua missão.

Um novo índice para a riqueza
Esperado – Que fosse lançado processo na ONU para desenvolver indicadores econômicos que complementassem ou substituíssem o PIB. Garantir que a contabilidade de governos e empresas reflitam lucros e prejuízos ambientais. O Produto Interno Bruto (PIB) sozinho não é mais capaz de avaliar a riqueza de um país, por medir apenas a atividade econômica, mas não a qualidade de vida de seus cidadãos ou seus recursos naturais.

Resultado – O texto reconheceu a necessidade de "medidas mais amplas de progresso" para complementar o PIB para melhor informar as decisões políticas. Pediu à Comissão Estatística da ONU que lance um programa de trabalho para se desenvolver sobre as iniciativas existentes.

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)
Esperado - Assim como a ONU adotou em 2000 os dez Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), com metas para acabar até 2015 com a extrema pobreza e a fome, promover a igualdade entre os sexos, erradicar doenças, a Rio+20 deveria adotar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) como novas metas globais para governos progredirem em indicadores sociais, ambientais e econômicos. As metas ODS seriam baseadas em até 26 temas (energia, segurança alimentar, erradicação da pobreza, água etc) e o prazo para serem atingidas seria 2030. 

Resultado - Assembleia Geral da ONU criará neste ano um grupo de trabalho de 30 países - seis de cada continente - para preparar a definição dos ODS e apresentará em setembro de 2013 um estudo à Assembleia Geral da ONU.

Também, no dia 04 de julho foi entregue ao secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, o primeiro relatório, denominado “Realizando o futuro que nós queremos para todos”, de uma Força-Tarefa sobre o Pós-2015 dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). O relatório - que pode ser utilizado como um roteiro inicial para a elaboração das ODS - não é um produto direto da Rio+20, mas sim de uma decisão do secretariado-geral da ONU que, em decorrência de uma reunião realizada em 2010 para avaliar a primeira década de implementação dos ODM, nomeou essa força-tarefa. O documento será analisado na reunião do Conselho Econômico e Social (ECOSOC), ao longo deste mês de julho, em Nova York. Clique aqui para ver detalhes do documento entregue a Ban Ki-Moon.

Proteção aos Oceanos
Esperado – Que saísse da Rio+20 um acordo de implementação da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar, de 1982, para proteger a biodiversidade em alto-mar.

Resultado – O texto se comprometeu a "tomar medidas para reduzir a incidência e os impactos da poluição nos ecossistemas marinhos, inclusive através da implementação efetiva de convenções relevantes adotadas no âmbito da Organização Marítima Internacional". Também propôs que os países ajam até 2025 para alcançar "reduções significativas" em destroços marinhos para evitar danos ao ambiente marinho, e se comprometeu a adotar medidas para evitar a introdução de espécies marinhas estranhas invasoras e administrar seus impactos ambientais adversos. Igualmente reiterou uma necessidade de trabalhar mais para prevenir a acidificação do oceano. No entanto, uma decisão muito esperada sobre uma estrutura de governo para águas internacionais, em especial em relação à proteção da biodiversidade, foi adiada por alguns anos.

Responsabilidades comuns, porém diferenciadas
Esperado – Manutenção de um dos pilares do documento da Eco92 - o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas -, que norteia acordos posteriores, como o Protocolo de Kyoto. Seu fundamento é que todos os países são responsáveis, mas quem polui mais (os países mais ricos), deveria combater o problema com mais força e financiar os esforços de quem polui menos (os países mais pobres) e norteia também a questão do financiamentos.

Resultado - Apesar de esforços de países (como os EUA) para tirar esse conceito do texto final, alegando que o eixo econômico mundial mudou e alguns países, antes considerados em desenvolvimento, hoje poluem tanto quanto os desenvolvidos, numa indireta à China, Índia e Brasil. Apesar da tentativa, o princípio foi mantido.

Financiamento e Tecnologia
Esperado - Para ajudar os países menos desenvolvidos na implementação da economia verde e o acesso a tecnologias mais limpas, o Brasil e vários países em desenvolvimento defendiam a criação do fundo anual de US$ 30 bilhões, a partir de 2013, e que alcançaria US$ 100 bilhões, em 2018. 

Resultado - Foram excluídos os detalhes sobre repasses financeiros, a imposição de cifras, a criação do fundo para o desenvolvimento sustentável, especificações sobre economia verde e transferência de tecnologia limpa. A proposta do fundo foi substituída por vários parágrafos, nos quais são estabelecidos compromissos conjuntos. Um grupo de 30 especialistas intergovernamental deverá, até setembro de 2014, produzir um relatório para a ONU que avalie quanto dinheiro é necessário para o desenvolvimento sustentável, e quais instrumentos novos e existentes podem ser utilizados para levantar mais fundos.

No texto há, ainda, seis itens com recomendações para os países fortalecerem as parcerias para a transferência de tecnologia limpa. Mas sem impor normas, pois a questão divide os países desenvolvidos e os em desenvolvimento. Em situações de impasse, o documento sugere que os ricos colaborem para o desenvolvimento sustentável, ação que vale também para as questões relativas à capacitação e ao comércio.

Se o evento diplomático oficial foi considerado um fracasso, em contrapartida ocorreram significativos avanços nos fóruns da sociedades civil (Major Groups e a Cúpula dos Povos).

Os Major Groups são compostos por representantes da sociedade civil, concentrados em áreas temas (Negócios e Indústria / Crianças e Jovens / Agricultores / Povos Nativos / Autoridades Locais / ONGs / Comunidade Científica e Tecnológica / Mulheres / Trabalhadores e Sindicatos) trabalharam intensamente, produzindo discussões e trabalhos técnicos de suporte, que poderiam ter orientado as decisões das delegações.
A Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, foi um evento paralelo organizado pela sociedade civil global, entre os dias 15 e 22 de junho, no Aterro do Flamengo,  O documento final do evento sintetiza os principais eixos discutidos durante as plenárias e assembléias, assim como expressam as intensas mobilizações ocorridas durante o período de sua realização que apontam as convergências em torno das causas estruturais e das falsas soluções, das soluções dos povos frente às crises, assim como os principais eixos de luta para o próximo período. As sínteses aprovadas nas plenárias  integram e complementam este documento político para que os povos, movimentos e organizações possam continuar a convergir e aprofundar suas lutas e construção de alternativas em seus territórios, regiões e países em todos os cantos do mundo. Você também pode ler a Declaração Final da Cúpula dos Povos, que ataca a mercantilização da vida e faz a defesa dos bens comuns e da justiça social e ambiental. 

A declaração final faz duras críticas às instituições multilaterais que, segundo a Cúpula, estão a serviço do sistema financeiro e não dão respostas ousadas para o problema ambiental e humanitário que o mundo precisa enfrentar. O evento paralelo foi um sucesso de público, reunindo cerca de 30 mil pessoas por dia no Aterro do Flamengo. 

Em paralelo às principais negociações governamentais no Rio, empresas, ONGs, universidades e institutos de pesquisas, e governos firmaram 705 “compromissos voluntários”, que foram apresentados à ONU, sendo que governos apresentaram apenas 50 deste total, e no âmbito privado 226 coube às empresas e 243 às instituições de ensino. Metas de transição para fontes de energia renovável, redução do consumo de água, neutralização de emissões de carbono pelo plantio de árvores e implementação de sistemas de compras e transporte sustentáveis foram alguns dos compromissos assumidos e entregues voluntariamente à ONU. Apenas os 13 maiores compromissos, segundo a ONU, vão injetar US$ 513 bilhões em projetos para o desenvolvimento sustentável nos próximos dez anos.

O fim da conferência da ONU levanta uma série de perguntas sobre o que esperar de seus resultados práticos? Muitos especialistas defendem que a Conferência não foi um fracasso, pois ela era para ser o final do processo, e sim o começo da jornada, já que alcançar metas metas mais amplas de sustentabili8dade não será algo possível da noite para o dia. "A economia verde não é uma grande explosão, é uma transição", disse Donald Kaberuka, do Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB). "Alguns dizem que levará até 50 anos para tanto.” Resta saber se o planeta irá suportar tantas décadas no atual ritmo de degradação ambiental.



FONTE: http://novo.maternatura.org.br

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