sexta-feira, 7 de setembro de 2012


A máfia do lixo, por André Trigueiro

Por André Trigueiro (*)
destaques
Lixo é assunto de prefeito. É dele a responsabilidade pelo sistema de coleta, transporte e destinação final dos resíduos. Invariavelmente os prefeitos recorrem a serviços terceirizados para cumprir essas funções. Editais mal formulados de licitação, falta de transparência e fiscalização deficiente compõem o cenário que tornou o lixo – não apenas no Brasil, mas em boa parte do mundo – um chamariz de corruptos.

O mercado se baseia no peso do lixo. Cobra-se pela tonelada de resíduo transportada de caminhão (as empresas do setor são remuneradas com base em estimativas de carga nem sempre precisas) e pela tonelada de resíduo que dá entrada em aterros sanitários (onde balanças rodoviárias deveriam aferir o peso e cobrar pelo descarte). Para cada tipo de resíduo há um valor específico, dependendo da periculosidade da carga. O custo da tonelada de resíduos industriais perigosos, por exemplo, pode chegar a mil reais, enquanto o lixo domiciliar flutua numa faixa de quarenta reais.
Não é difícil imaginar porque a maioria dos prefeitos no Brasil – sem o amparo de uma boa assessoria técnica – ainda destinem seus resíduos em vazadouros clandestinos. Invariavelmente eles herdam o problema de seus antecessores, temem os custos inerentes a destinação correta dos resíduos, e mantém a rotina criminosa de descartar o lixo em lugar impróprio alugando o serviço de uma empresa de transportes pelo preço médio de cinco reais a tonelada. Há também a presunção de que cuidar bem do lixo não dá voto, além do risco de não conseguir resolver o problema até o fim do mandato. Em resumo: melhor deixar tudo como está, ainda que uma nova Lei Federal – a Política Nacional de Resíduos Sólidos – estabeleça o prazo limite de 2014 para a existência de lixões em território nacional.
É preciso deixar claro que todas as ações em favor da destinação inteligente dos resíduos (reciclagem do lixo seco, compostagem do lixo úmido, reaproveitamento de entulho, produção de energia, etc.) encontra forte resistência de prefeitos mal informados, incompetentes ou que agem de má fé por obterem alguma recompensa ilícita despejando o lixo em vazadouros. Estes encontram o apoio de empresários que se locupletam das estimativas grosseiras – invariavelmente arredondadas para cima – do peso de lixo que levarão em seus caminhões sabe lá Deus pra onde.
Ainda que o município disponha de um aterro sanitário – ou tenha a opção de descartar o lixo num depósito credenciado no município vizinho – pode-se coletar o material e evitar a cobrança feita pelo aterro (os recursos ajudam a cobrir os custos do tratamento dos gases e do chorume, além do manejo adequado dos resíduos) despejando em outro lugar qualquer onde ninguém flagre o lançamento e nem cobre por isso. A situação é particularmente grave quando se trata dos “Resíduos Classe 1″, também chamados de resíduos perigosos, por terem as seguintes características definidas pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) : “inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade e patogenicidade”. Lixo hospitalar e resíduos industriais, por exemplo, se enquadram nessa categoria.
Por razões óbvias, tanto o transporte quanto a destinação final desse lixo perigoso determinam cuidados especiais e custos elevados, razão pela qual a tentação de não seguir a risca o que determina a lei para economizar uns trocados é gigantesca. Como o Brasil é um país continental, há muitas rotas de fuga para despejar esses resíduos em lugares inadequados, com enormes riscos à saúde humana e ao meio ambiente. É expressiva a quantidade de áreas contaminadas nas cercanias das zonas industrias do Brasil. A Rede Latino Americana de Prevenção e Gestão de Sítios Contaminados (Relasc) disponibiliza farto material a respeito no site da entidade http://www.relasc.org. Apenas no Estado de São Paulo existem 2.272 áreas comprovadamente contaminadas.
Esse problema não seria tão preocupante se houvesse vontade política para fiscalizar caminhões e carretas e cobrar dos respectivos motoristas o “manifesto de resíduos”, uma declaração exigida por lei que especifica origem, destino e classificação do lixo transportado. Cabe aos órgãos ambientais estaduais a devida fiscalização desses materiais. Mas, aqui entre nós, alguém parece preocupado com isso? E os seus candidatos a prefeito e a vereador? Qual a posição deles sobre tudo isso? Em tempo de eleições municipais, convém prestar atenção de que lado eles estão. Esse é o tipo de assunto sobre o qual não dá para ficar em cima do muro. Quem está a favor da máfia do lixo, está contra você e a sua cidade.
* André Trigueiro é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe-UFRJ onde hoje leciona a disciplina geopolítica ambiental, professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livro Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um dos autores dos livros Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia, lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, pela Editora FEB, em 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário da Rádio Rio de Janeiro.
** Publicado originalmente no site Mundo Sustentável.
(Mundo Sustentável)
fonte; www.plurale.com.br/noticias-ler.php

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