quarta-feira, 24 de julho de 2013

Pegada Ecológica: e se eliminarmos os países ricos? artigo de José Eustáquio Diniz Alves

Pegada Ecológica
A Terra é um Planeta finito. Isto significa que os seres vivos possuem um espaço comum e delimitado para a sobrevivência conjunta. O crescimento exponencial de uma espécie significa a redução do espaço para a vida de outras espécies. Da mesma forma, o crescimento ilimitado de cada país aumenta a demanda global por matérias-primas e commodities e contribui para o sobre-uso dos recursos naturais. Ninguém vive sem demandar bens materiais dos ecossistemas.

A Pegada Ecológica é uma metodologia que mede o impacto humano sobre as áreas terrestres e aquáticas, consideradas biologicamente produtivas e necessárias à disponibilização de recursos ecológicos e serviços, como alimentos, fibras, madeira, terreno para construção e para a absorção do dióxido de carbono (CO2) emitido pela combustão de combustíveis fósseis etc. A Pegada Ecológica mede a quantidade de área biologicamente produtiva – zona de cultivo, pasto, floresta e pesca – disponível para responder às necessidades da humanidade.
Segundo o Relatório Planeta Vivo, da WWF, com dados de 2008, as atividade antrópicas já haviam ultrapassado a biocapacidade da Terra, que é de 12 bilhões de hectares globais (gha). A Pegada Ecológica da humanidade atingiu 2,7 gha por pessoa para um população de 6,7 bilhões de habitantes em 2007. Isto significa que a humanidade já estava utilizando 18 bilhões de gha, 50% a mais do que a capacidade de regeneração do Planeta.
Os países do mundo com maior pegada ecológica, em 2008, eram Emirados Árabes e Qatar, com mais de 10 gha por pessoa. Porém, como são países com baixo número de habitantes, o impacto global é relativamente pequeno. Já os Estados Unidos da América (EUA) tinham uma população de 305 milhões de habitantes e uma pegada de 7,2 gha por pessoa, em 2008. Isto quer dizer que o impacto global dos EUA foi de 2,2 bilhões de gha. O padrão de consumo destes 3 países não é generalizável para o resto do mundo.
A pegada ecológica per capita dos países de alta renda (desenvolvidos) foi de 5,6 gha, em 2008, para uma população de 1,037 bilhão de habitantes, o que representava uma pegada total de 5,768 gha. Eliminando-se a pegada total dos países ricos o déficit ecológico global diminuiria muito, mas mesmo assim haveria um déficit, ainda que menor, para o restante dos habitantes do mundo, com uma pegada ecológica total de 12,2 bilhões de gha. Portanto, mesmo eliminando-se os impactos negativos dos países ricos, o restante do mundo estaria vivendo acima da capacidade de suporte (biocapacidade) da Terra.
Ou seja, os 5,6 bilhões de habitantes dos países de renda baixa e de renda média (países em desenvolvimento), em 2008, tinham uma pegada ecológica total de 12,2 bilhões de hectares globais (gha), superior à capacidade de carga (biocapacidade) do Planeta. Desta forma, mesmo em uma situação hipotética em que os países ricos chegassem a zero em sua pegada ecológica, ainda assim o mundo estaria com problema ambiental e com uma Pegada Ecológica acima da Biocapacidade. E o pior é que os países do chamado “sul global” continuam com população em crescimento e com um modelo econômico que mimetiza o que tem de pior nos países desenvolvidos.
Portanto, mesmo eliminando os países ricos do cálculo da Pegada Ecológica mundial as atividades antrópicas do resto da população do globo continuam superiores à capacidade de regeneração da biosfera. Os cálculos acima não tiram as responsabilidades dos países desenvolvidos como os maiores poluidores do Planeta. Apenas mostram a real dimensão dos problemas causados pelos tamanhos do consumo e da população.
É compreensível que as populações dos países pobres aspirem níveis mais elevados de desenvolvimento e consumo. Mas reproduzir o modelo dos países ricos e poluidores seria um desastre total. Também é compreensível que os indignados do mundo lutem por melhores escolas, hospitais, transporte público, lazer, etc. Mas não é aceitável e nem viável se promover o desenvolvimento humano às custas do empobrecimento do Planeta e da biodiversidade. O consumo médio da população mundial já ultrapassou os níveis de sustentabilidade ambiental. Simplesmente distribuir a riqueza e o consumo humano não resolve os problemas ambientais globais.
Seguindo o princípio das “Responsabilidades comuns mas diferenciadas” a ONU deveria cobrar dos países ricos suas dívidas pelos danos causados ao meio ambiente global. Mas, acima de tudo, seria preciso que toda a comunidade internacional se engaje na luta pela mudança do atual modelo marrom de desenvolvimento e de consumismo exacerbado. Só uma economia de baixo carbono, limpa, com baixo nível de consumo conspícuo, não poluidora, que respeite a biodiversidade e seja socialmente justa poderia mitigar os danos mais impactantes da degradação ambiental e o desastre do aquecimento global.

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

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